A ideia de "professores analógicos" em escolas com "alunos digitais"
sempre volta à tona quando o debate é a chegada da tecnologia na sala de
aula. A diferença de gerações é essencial nessa relação, mas há uma
crise que cabe principalmente ao poder público resolver: a formação dos
docentes ainda não contempla essa nova realidade e desafios.
As lacunas de formação que fazem com que professores cheguem às escolas
já defasados em relação ao uso da tecnologia são sentidas pelas
secretarias de Educação. "Graduações e licenciaturas atualmente em seu
currículo tratam a tecnologia e seus recursos de maneira superficial,
pois a formação desses profissionais dá-se a partir de embasamentos
teóricos, não relacionando a prática com a real função das tecnologias
na educação", diz a presidente do Conselho Nacional de Secretários de
Educação, Maria Nilene da Costa.
A educadora ressalta que a presença de recursos digitais vem avançando
nas escolas do País, com projetos do Ministério da Educação (MEC) e
também das esferas estaduais - o que pressiona o professor. "O docente
que está iniciando a carreira ainda se depara com dificuldades de
inserir o uso das tecnologias e recursos midiáticos de maneira
interdisciplinar, reproduzindo ainda as aulas tradicionais."
O maior desafio para a presidente da União Nacionais dos Dirigentes
Municipais de Educação (Undime), Cleusa Repulho, é incorporar a
tecnologia desde a formação inicial. "A tecnologia não está integradas
nas faculdades e na sala de aula, é notória a angústia dos professores",
diz ela. "O segredo é fazer com que todos os professores entendam que
isso é importante." Cleusa lembra que cabe ao MEC induzir políticas
públicas. A pasta informou que pretende oferecer capacitação a todos os
cerca de 500 mil professores do ensino médio nos tablets que está
distribuindo. Os cursos, voluntários, têm duração de quatro a seis meses
e são semipresenciais.
Apesar de receber críticas sobre a distribuição de tablets sem que
houvesse uma plataforma específica para seu uso, o ministro Aloizio
Mercadante tem mostrado preocupação com a formação. Em entrevista ao
Estado publicada ontem - quando se revelou que o ministério trabalha na
criação dessa plataforma -, Mercadante reafirmou que a capacitação dos
professores é a prioridade. O ministro já repetiu algumas vezes que os
estudantes estão no século XXI, enquanto professores, no século XX.
Diferenças
Além de achar a comparação infeliz, o professor Nelson Pretto, da
Universidade Federal da Bahia (UFBA), ressalta que a diferença de
gerações entre professor e aluno sempre existiu e não é tão
problemática. "O aluno é jovem e por natureza traz a novidade, o
desafio. Se um dia for muito diferente é que teremos de nos preocupar."
Especialista em educação e comunicação, Pretto concorda EM que a
formação inicial precisa ser transformada, para que não se dependa tanto
da capacitação em serviço. "Necessitamos de uma revolução na formação,
mas ela tem de ser acompanhada por uma revolução nas condições de
trabalho e salário. Não é possível termos tantas expectativas com a
educação sabendo as condições dos professores."
Professor da escola municipal Guiomar Cabral, de Pirituba, zona oeste
de São Paulo, André Bastos, de 41 anos, lembra que aprendeu mexer no
Power Point, programa de apresentações, porque um aluno o ensinou. Mas
para ele, isso só pode ser positivo. "A educação é uma via de mão dupla,
eu tenho de tirar vantagem disso. O bom é que o aluno fica ainda mais
protagonista", diz ele, professor de português há 20 anos. "E esse é um
desafio permanente do professor. Ele sempre entra na sala sem saber onde
uma pergunta vai levar a aula." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.